Skip to main content

Imprensa livre, direito atento

Temos sido atravessados por uma onda de desinformações com fins políticos, sociais e econômicos

Por Igor Sant’Anna Tamasauskas e Beatriz Canotilho Logarezzi

Defender a liberdade de imprensa no Brasil de hoje nem sempre é tarefa fácil, apesar de necessária. Temos sido atravessados por uma onda de desinformações com fins políticos, sociais e econômicos nem sempre de compreensão imediata. Combater algo tão sério —facilitado pela dinâmica impressionante das redes sociais— e, ao mesmo tempo, preservar o que é arma contra a desinformação (o jornalismo profissional) exige reflexões que muitas vezes só surgem de quem vive a rotina de apurar, checar a publicar informação com responsabilidade.

Falamos aqui de um julgamento recente do Supremo Tribunal Federal no qual atuamos pela Abraji: o Tema 995 de repercussão geral. Nesses casos, o STF firma uma tese que deve ser seguida por todos os tribunais. A discussão abordou a possibilidade de responsabilizar um veículo que publica uma entrevista em que o entrevistado acusa falsamente alguém de cometer um crime.

Elaborar uma tese de repercussão geral nunca é simples. Não basta a intenção de quem redige, é preciso considerar como a redação será aplicada em contextos diversos. E, nesse tema, o alerta é maior.

O cerceamento da imprensa no Brasil tem raízes profundas e autoritárias. A Lei de Imprensa de 1967, que institucionalizou a censura, foi julgada inconstitucional apenas em 2009. Mais recentemente, especialmente no governo anterior, houve recorde de ataques a jornalistas por possibilitarem visões críticas e independentes.

O debate não se resolve em extremos: como pontuaram ministros, há veículos que agem de má-fé, espalhando desinformação até por meio de entrevistas encomendadas. Mas isso não se confunde com o jornalismo profissional —e é justamente por isso que o Judiciário precisa saber diferenciar. O desafio continua sendo separar desinformação de informação desconfortável.

Foram meses de reflexões. O relator, ministro Fachin, primeiro propôs uma tese bem-intencionada, mas com um trecho genérico sobre responsabilização da imprensa. O risco era que esse tópico fosse utilizado em toda e qualquer situação. Na prática, esse trecho passou a ser usado para justificar condenações diversas: de publicações de fotos sem autorização a erros factuais sem qualquer relação com entrevistas. Havia ainda expressões vagas e nenhuma previsão para situações excepcionais, como entrevistas ao vivo.

Criar brechas para responsabilizações equivocadas inibe o jornalismo. Multiplicam-se ações infundadas e veículos deixam de publicar por medo de processos, prejudicando o debate público livre e de qualidade.

Diversas entidades, como a Abraji, se mobilizaram sobre o assunto. Atuamos no processo como amicus curiae e levamos à corte diagnósticos técnicos e exemplos concretos dos riscos de um Judiciário instrumentalizado para intimidar a imprensa. Foi a partir desse movimento que o julgamento foi ajustado e se aproximou mais da realidade vivida nas Redações.

A tese final incluiu um ponto essencial: a exigência de dolo (intenção de divulgar algo falso) ou culpa grave (negligência profissional evidente), alinhando essa tese com decisões anteriores. Caiu o tópico inicial que falava em responsabilização geral da imprensa e foi incluída a exceção relativa às entrevistas ao vivo, reconhecendo as limitações práticas desse formato.

Esse movimento de escuta merece ser celebrado e, mais do que isso, precisa servir de exemplo. Ter a humildade de considerar importantes detalhes antes desconhecidos e ouvir o que a sociedade tem a dizer é dever de quem tem nas mãos poder para decidir temas que impactam diretamente a vida das pessoas. É justamente no encontro com as complexidades que damos um passo rumo ao que é mais justo.

O resultado, apesar de não ser perfeito, é uma formulação mais clara, equilibrada e conectada com a realidade de quem faz jornalismo sério. É assim que o direito se fortalece como ferramenta de democracia, não de silenciamento. E é de imprensa, mas também de democracia, que estamos falando.
Porque não há democracia saudável sem imprensa verdadeiramente livre.

Beatriz Canotilho Logarezzi

Especialista em direito processual civil, é advogada da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo

Fonte: https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2025/07/imprensa-livre-direito-atento.shtml

A meca do cibercrime

Combater o cibercrime exige mais do que identificar e punir o eventual autor da fraude

“Sou um rico empresário do leste europeu e tenho uma proposta para você enriquecer, basta clicar no link abaixo”; “sou herdeiro de uma senhora, e com sua contribuição podemos liberar a herança e virar milionários em pouco tempo”; “central de alerta do banco: entre no link para solucionar problemas urgentes”. Todos já recebemos mensagens parecidas, armadilhas para os golpes mais variados. Falsas promessas, de dinheiro ou de amor, páginas clonadas, subtração de senhas, programas piratas e inúmeras iscas, prontas para subtrair bens e valores de incautos ou sequestrar dados de empresas e cobrar resgate por sua devolução.

Os chamados crimes cibernéticos assustam pelo volume. A Cybersecurity Ventures estima que os custos relacionados a esses delitos chegarão a quase US$ 10 trilhões este ano. No Brasil, o 5.º país do mundo em número de ataques cibernéticos, foram apontados, no ano passado, 1.379 crimes dessa espécie por minuto, causando prejuízos na casa dos R$ 10 bilhões, segundo a Febraban. Não à toa, Andrei Rodrigues, diretor-geral da Polícia Federal (PF), tem apelidado a prática de cangaço digital.

As propostas para enfrentar o problema são as mais diversas, dos usuais aumentos de pena e “transformação em crime hediondo”, a políticas de educação e prevenção, passando pelo uso de programas de proteção dos usuários de serviços digitais. Dentre elas, talvez as mais interessantes sejam aquelas que sugerem rastrear e bloquear o dinheiro oriundo desses crimes e identificar as agências e instituições que colaboram com sua ocultação.

Os recursos ganhos com as ciladas digitais, em regra, são depositados em contas bancárias ou em carteiras de criptomoedas. Permanecem segundos no mesmo local e são logo transferidos para outras contas e carteiras, misturados com outros recursos e espalhados pelo mundo. Seguir esse dinheiro é tarefa cada vez mais árdua.

A solução para capturar esses bens talvez não seja sua perseguição furiosa e açodada, mas identificar aqueles que ajudam na criação das redes de fuga. Nem sempre se trata de personagens secretos, que atuam em subsolos, na deepweb. Às vezes, são instituições sólidas, reguladas, que ofertam seus serviços ao público em geral e são conhecidas das autoridades.

Matéria recente do The New York Times mostra como afiliadas de um conglomerado financeiro importante do Camboja oferecem os mais diversos serviços aos ciberdelinquentes. De bazares virtuais, em que estelionatários podem conhecer agentes de lavagem de dinheiro, a meios de pagamento sofisticados que dificultam o rastreamento do dinheiro, são várias as comodidades à disposição dos clientes do mundo todo. A mesma reportagem aponta como o Telegram possibilita que ofertantes e demandantes de serviços de ocultação internacional de bens troquem mensagens, combinem atividades e estratégias para levar a cabo seus interesses.

Nesse sistema, o criminoso virtual cede 15% de seus ganhos a um matchmaker, agente que organiza todo o sistema de ocultação de bens com uma rede de laranjas e empresas fantasma ao redor do mundo. Uma vez contatado, esse matchmaker deposita o valor que o cliente afirma que será subtraído da potencial vítima, em uma conta-garantia oferecida pela instituição financeira que controla o bazar. Se tudo correr bem (ou mal, sob a perspectiva da vítima), o dinheiro percorrerá o mundo em poucos minutos, espalhado entre os mais diversos agentes do matchmaker, enquanto o criminoso levanta os recursos que estavam em garantia, recebendo-os em dinheiro ou criptoativos, limpos de qualquer relação com a transação fraudulenta original. O sistema parece funcionar tão bem que a própria agência que organiza o bazar do crime criou uma moeda virtual própria, para facilitar seus “negócios”.

Esse sistema mostra que, sobre os corredores subterrâneos do fluxo do dinheiro sujo, existem instituições reguladas, conhecidas, legalizadas, que se beneficiam do volume movimentado pelo mercado ilegal, em geral operando em países com menor rigor no combate à lavagem de dinheiro.

Inibir sua atuação no território nacional exige reorganizar as instituições públicas. A criação de uma Agência Nacional de Cibersegurança e a cooperação com as instituições financeiras para troca efetiva de dados, são os passos iniciais. Regulamentar as operações das entidades que operam criptoativos, como exigido em lei, também é fundamental. Capacitar o Coaf com meios materiais e humanos para seguir com sua atividade de recepção e compartilhamento de atos suspeitos de lavagem de dinheiro, aumentar o âmbito de abrangência das entidades reguladas, e capacitar instituições para suspender Pix, TEDs e outras transações ligadas a CPFs de suspeitos de intermediar operações ilegais também são medidas relevantes.

Combater o cibercrime exige mais do que identificar e punir o eventual autor da fraude. É preciso encontrar quem oferece o suporte institucional para sua atuação, que desenvolve as redes internacionais pelas quais transitam os recursos e que garante seu usufruto final. É mais difícil, mais complexo, são necessários mais recursos, mais inteligência, mas os resultados serão muito mais efetivos.

Fonte: https://www.estadao.com.br/opiniao/espaco-aberto/a-meca-do-cibercrime/#:~:text=A%20meca%20do%20cibercrime%20%2D%20Estad%C3%A3o&text=Express%C3%A3o%20do%20ponto%20de%20vista,convencer%20ou%20influenciar%20o%20leitor

Especialistas defendem atenção à governança e à ética nas companhias

Evento do ‘Valor’ conclui que boas práticas são essenciais para confiança nas instituições e que período turbulento não deve enfraquecer ações

A discussão sobre o papel dos setores público e privado na governança e como lidar com questões éticas nas corporações em um momento de grandes questionamentos sobre algumas práticas foram os principais temas do Fórum Ética e Compliance, realizado pelo Valor na quinta-feira (26).

Com retrocessos vistos no mercado, as práticas de governança das empresas sofrem com desconfiança e frequentemente têm sua necessidade questionada. A visão de especialistas, entretanto, é de que um período turbulento não deve enfraquecer as ações, e que boas práticas são essenciais para a retomada da confiança nas instituições públicas e privadas.

Para Marcelo Trindade, advogado e ex-presidente da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), as empresas reagem ao estímulo, principalmente, do mercado e de governos. “Estamos em um momento de grande instabilidade nas duas demandas. Na demanda estatal, por uma boa governança e na preocupação com a ética, e do mercado, com o ESG como um todo, e pela ética, em particular.”

“Num mundo tão tumultuado, o Judiciário tem que garantir a dignidade, a cidadania, o pluralismo e o trabalho como valor”
— Cármen Lúcia

Trindade acredita que esse momento de turbulência vai passar, que as leis, ainda que em alguns casos estejam enfraquecidas, não foram revogadas. Como exemplo ele cita o caso do Foreign Corrupt Practices Act (FCPA), lei americana de combate à corrupção, que é alvo de questionamentos do presidente Donald Trump. Para ele, há um “desafio” a não se dar tanta atenção à governança neste momento. O advogado entende que é preciso agir com cuidado, mas que essa fase vai passar. “As leis estão aí, e a gente precisa continuar cumprindo essas normas.”

Na visão de Carolina Junqueira, diretora de riscos e compliance do Grupo Globo, as empresas podem ocupar esse espaço de retomada da confiança nas instituições. “A confiança é civilizatória, mas temos visto uma deterioração da confiança em instituições de maneira geral, não só no poder público”, afirmou.

Sendo uma área mais recente do direito, com parte do arcabouço de regras sendo aprovado há pouco mais de uma década, como o caso da Lei Anticorrupção, de 2013, a instabilidade da defesa dessas regras torna as boas práticas ainda mais desafiadoras.

“Diante de um cenário em que há alguns retrocessos, ter uma governança socioambiental dentro das empresas é fundamental para cristalização e incorporação dessas políticas, para incorporação dessas políticas na estrutura corporativa de fato”, defende Luiz Carlos Faria Jr, advogado da área de empresas e direitos humanos do escritório Tozzini Freire.

Nesse cenário das empresas sendo ativas na defesa e na aplicação da governança, a avaliação é de que as companhias estão preparadas para essa liderança. “As empresas estão preparadas, mas há espaço para algo melhor. Há espaço para uma governança melhor”, afirma Ricardo Lamenza, vice-presidente do conselho de administração do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC). A crença, inclusive, é de que a governança é a base para aplicação dos outros princípios do ESG, o social e o ambiental. “Sem o G [de governança], não há como discutir de maneira concreta os outros dois itens.”

Na esfera pública, para o funcionamento efetivo das boas práticas, um dos pontos de destaque é a necessidade de segurança jurídica. Para a ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) e presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Cármen Lúcia, em tempos de profundas transformações sociais e tecnológicas, a segurança jurídica está em manter o equilíbrio dos princípios que regem constitucionalmente todas as relações.

A ministra defendeu que o STF deve atuar com firmeza na proteção da Constituição, funcionando como garantidor dos direitos fundamentais.

“Num mundo tão tumultuado, tão conflituoso, em que as raivas e os ódios parecem tomar o lugar dos afetos, o Judiciário tem que garantir a dignidade, a cidadania, o pluralismo e o trabalho como valor – e não como castigo”, acrescenta.

No contexto empresarial, o advogado e professor Pierpaolo Bottini destaca que o avanço da ética nas organizações passa por dois eixos: o aprimoramento do marco legal e a reorganização cultural. “A partir de 2013, com a Lei Anticorrupção e a Lei de Organizações Criminosas, houve uma mudança de paradigma. As empresas passaram a ser responsabilizadas não apenas por atos diretos, mas também por omissões. Isso exigiu uma estrutura de compliance mais ativa e autônoma”, explicou. No entanto, ele alertou que a cultura ainda precisa acompanhar esse avanço. “Não adianta investir em sistemas formais se, na prática, a cultura interna tolera desvios.”

Para Marcela Grego, coordenadora de integridade e transparência do Instituto Ethos e coordenadora do grupo de trabalho sobre integridade socioambiental e mudanças climáticas da Controladoria-Geral da União (CGU), não é mais possível considerar uma empresa íntegra apenas por estar em conformidade com normas anticorrupção. “Hoje, uma empresa que tem casos de assédio, racismo ou violações ambientais não pode ser considerada íntegra. Precisamos de um novo paradigma, que una integridade à agenda de direitos humanos e sustentabilidade”, afirmou.

Flávia Moreira, juíza ouvidora do STF, defende que, para que se possa construir um futuro mais justo e inclusivo, é preciso se “reconciliar com a nossa história de opressão” – referenciando-se à ditadura, escravidão, racismo e patriarcado. Ela defende que a equidade só será possível com instituições comprometidas com diversidade e reparação histórica. “Não tem como construir um caminho ético sem dar espaço aos grupos subalternizados.”

Ricardo Wagner de Araujo, diretor de governança e conformidade na Petrobras e auditor da CGU, reforçou a importância da colaboração entre os setores. Para ele, não adianta a existência de leis, normativos e órgãos com grande capacidade de repressão se não houver um compromisso ético dentro das organizações. “É preciso sinergia entre o público e o e o privado”, disse.

Ainda com relação ao papel do poder público na governança, a ministra Cármen Lúcia afirmou não ver problemas na instituição de códigos que deem mais transparência ao Judiciário.

Na segunda-feira, a seccional de São Paulo da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP) instalou uma comissão para debater uma reforma ampla do Poder Judiciário. A comissão pretende debater temas como mandatos para os ministros no STF, taxas e custas do Judiciário, foro por prerrogativa de função e código de conduta para magistrados.

Perguntada sobre o tema, a ministra disse considerar legítima a proposta de estabelecer regras mais claras para reforçar a imparcialidade. “Essas discussões são importantes. Se nós já temos essa obrigação, ter um código de ética, para mim, é um dado a mais.”

Carmen Lúcia ainda defendeu o fortalecimento da transparência, inclusive em atividades extrajudiciais. “Cada vez mais a publicidade, a transparência se fazem necessárias para que as pessoas possam confiar integralmente no seu país.”

Em palestra no encerramento do evento, o economista Eduardo Gianetti defendeu ainda que, para além das regras, é preciso uma mudança de comportamento para que as regras de governança sejam respeitadas por todos nas organizações. Para isso, ele vê a necessidade de uma “liderança legítima” que funcione como referência.

“É a liderança que se legitima e que consegue mobilizar e permitir uma autonomia responsável por parte de todos aqueles que pertencem ao grupo”, detalha. “O desafio que está colocado para a governança, e que está sempre se renovando, é garantir essa mobilização e a criação de um espaço de autogoverno para que cada membro da organização possa se sentir autorizado a tomar decisões, a fazer melhor as coisas que está fazendo por vontade própria. Sabendo que aquilo também redunda evidentemente em algum tipo de conquista que será compartilhada.”

O Fórum Ética e Compliance tem patrocínio da Ambipar e apoio do Grupo Globo.

Fonte: https://valor.globo.com/brasil/noticia/2025/06/27/especialistas-defendem-atencao-a-governanca-e-a-etica-nas-companhias.ghtml

Fórum Ética e Compliance

O fórum “Ética e Compliance” acontece nesta quinta-feira (26) em São Paulo. A ministra do Supremo Tribunal Federal, Cármen Lúcia, fará a abertura do evento. No segundo painel “Construindo um futuro ético” participam os painelistas Pierpaolo Cruz Bottini, Flávia Martins, Marcela Greggo, Daniela Rodrigues Teixeira e Catherine Vieira.

Inscrições em: https://oglobo.globo.com/projetos/eticaecompliance/

‘É uma luta inglória’, diz advogado de Drauzio Varella sobre guerra contra deepfakes

O médico teve o rosto e a voz replicados por IA em vídeos que promovem a venda de produtos ilegais

A Justiça paulista deu razão a Drauzio Varella na batalha contra as deepfakes. Decisão recente ordena a remoção imediata de vídeos falsos que usam inteligência artificial para simular falas do médico — tudo para vender produtos ilegais.

“Além de ferir a honra do Dr. Drauzio, esses conteúdos colocam a saúde pública em risco. Muita gente acredita e acaba se automedicando”, diz Otávio Mazieiro, do escritório Bottini e Tamasauskas, que defende o médico.

Mas a estratégia da defesa vai além da remoção pontual de vídeos. “Cada anúncio retirado dá lugar a dezenas no dia seguinte. É uma luta inglória”, resume Mazieiro. O foco agora está no inquérito do Ministério Público de São Paulo, que mira os autores das montagens. Vários já foram identificados — e a investigação segue.

Fonte: https://www.estadao.com.br/cultura/alice-ferraz/e-uma-luta-ingloria-diz-advogado-de-drauzio-varella-sobre-guerra-contra-deepfakes/

O crime de stalking para além das relações privadas

A criminalização da conduta e o desenvolvimento de políticas para inibir a prática são passos relevantes para proteger a liberdade e a intimidade das pessoas e a paz na convivência social

A perseguição é um ato de violência. Ainda que não haja agressão física, a ameaça, expressa ou implícita, e a perturbação psicológica dela derivada afetam profundamente a paz da vítima. Aquele que acorda todos os dias com uma mensagem ameaçadora, um post agressivo, uma alusão perturbadora, é afetado profundamente em sua integridade psíquica e
emocional.

Por muito tempo, a perseguição não foi considerada crime, em geral pela falta de ameaças contundentes ou agressões reais. A perturbação, ainda que sistemática e constante, não chamava a atenção das autoridades por ser insidiosa, dissimulada. Ainda que abalasse a vítima, não indignava o grande público pela ausência de violência efetiva. A partir de um aumento de casos de abuso entre ex-casais, nos quais um deles perseguia com regularidade o outro por meios físicos e digitais, causando transtornos na vítima em seus familiares, o stalking passou a ser criminalizado em 2021, definido como o ato de perseguir alguém, reiteradamente e por qualquer meio, ameaçando-lhe a integridade física ou psicológica, restringindo-lhe a capacidade de locomoção ou, de qualquer forma, invadindo ou perturbando sua esfera de liberdade ou privacidade. A pena é de reclusão, de 6 meses a 2 anos, e multa, sendo
aumentada quando o crime é cometido contra criança, adolescente ou idoso, contra mulher por razões da condição de sexo feminino, mediante concurso de 2 ou mais pessoas ou com o emprego de arma.

Se no início tinha relação estreita com situações de violência doméstica ou de perseguições derivadas do rompimento de relações amorosas, o delito passou, nos últimos tempos, a ser reconhecido em diversos outros âmbitos: em relações trabalhistas, em que o patrão ou o empregado perseguem um ao outro em decorrência de ressentimentos mútuos ou pelo não cumprimento de determinadas obrigações; no âmbito acadêmico, em razão de pleitos não acolhidos ou de reprovações não esperadas; em relações societárias, por conflitos entre acionistas ou operadores de mercado; e mesmo entre fãs e seus artistas preferidos, quando a admiração se transforma em uma obsessiva perseguição para obtenção de atenção da vítima.

No âmbito político, institucional ou profissional, é comum que o stalking tenha o objetivo de intimidar manifestações ou o regular desempenho das atividades da vítima. O uso de milícias digitais contra magistrados, parlamentares, jornalistas ou advogados é uma forma de inibir sua atuação, restringir sua voz ou cercear suas opiniões e manifestações. Ocorrem quando são debatidas questões polêmicas, quando o profissional incomoda determinado grupo com sua atuação, ou quando deixa de favorecer expectativas artificialmente criadas. São casos em que, para além da liberdade da vítima, afeta-se a coletividade, o bem público representado por esses atores sociais.

O stalking ganha contornos graves quando praticado por meio de redes sociais, que potencializam a perseguição pontual e física por meio de postagens e mensagens compartilhadas com milhares de pessoas. O perseguidor divulga fatos íntimos, faz insinuações ou busca descredibilizar a vítima. Inúmeras pesquisas apontam que o Brasil seria, atualmente, o terceiro maior consumidor de redes sociais do mundo, com cerca de 130 milhões de pessoas conectadas e com acesso a plataformas, o que potencializa ataques e ofensas. Há casos em que os criminosos criam páginas, usam blogs ou influenciadores para abalar a tranquilidade do perseguido e de seus familiares, afetando sua paz com mais intensidade do que quando são utilizados os meios tradicionais.

Nesse contexto, é oportuna a criminalização do stalking, que permite não só o processo e a condenação dos agressores, mas também a tomada de medidas cautelares para fazer cessar a prática no momento de sua ocorrência, afastando o criminoso da vítima, suspendendo sua atividade digital ou proibindo-o de mencionar o perseguido em suas manifestações nas redes sociais. Há cada vez mais casos em que juízes proíbem réus de usar redes sociais, de frequentar determinados lugares ou vedem qualquer
alusão às vítimas por parte do acusado. Mas é preciso ir além. As polícias devem ser capacitadas e treinadas para investigar os fatos, encontrar a autoria de perseguições digitais por meio de quebras de sigilo e com o auxílio de aplicativos que colaborem na
identificação de IPs e endereços dos agressores. As plataformas e redes precisam auxiliar nessa tarefa, compartilhando informações e cumprindo medidas cautelares, nos termos da legislação. E os agentes políticos devem promover campanhas de esclarecimento e educação para comunicar a gravidade do ato e as consequências severas de sua prática.

Em uma época em que a informação é transmitida em frações de segundo, com a massificação de ataques reiterados ocorridos por meio digital, a tomada de consciência da seriedade do ato, a criminalização da conduta e o desenvolvimento de políticas para inibir sua prática são passos relevantes para proteger a liberdade e a intimidade das pessoas e a paz na convivência social.
Pierpaolo Cruz Bottini, Tiago Rocha e Pablo Naves Testoni são, respectivamente, advogado criminalista, professor de Direito Penal da Faculdade de Direito da USP e sócio do Bottini & Tamasauskas Advogados; advogado criminalista e sócio do Bottini & Tamasauskas Advogados; e advogado criminalista e sócio do Paoletti & Naves eTestoni Sociedade de Advogados

Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser
responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações

Fonte:https://valor.globo.com/legislacao/coluna/o-crime-de-stalking-para-alem-das-relacoes-privadas.ghtml

TJ/SP condena canil por maus-tratos a mais de 1.700 cães

O tribunal reconheceu dano moral coletivo e fixou indenização de R$ 50 mil que será destinado ao FID – Fundo de Interesses Difusos.

O TJ/SP condenou o Canil Céu Azul, em Piedade/SP, e sua proprietária, Nena Mitsue Miyazaki Kubaiassi, ao pagamento de R$ 50 mil por danos morais coletivos, em razão de práticas reiteradas de maus-tratos a centenas de cães. A verba será destinada ao FID – Fundo de Interesses Difusos.

A decisão, unânime, é da 1ª câmara Reservada ao Meio Ambiente. O colegiado reconheceu os maus-tratos a mais de 1.700 cães que viviam em condições degradantes. A ação foi movida pelo do Instituto Caramelo (Instituo Luisa Mell) após o resgate dos animais.

Insalubridade e sofrimento animal

A ação civil pública foi ajuizada pelo Instituto Caramelo contra o canil, sua proprietária, a CETESB, o estado de São Paulo e o município de Piedade. Os animais eram mantidos em ambientes pequenos, insalubres, com superlotação, ausência de assistência veterinária, uso de medicamentos vencidos e descarte irregular de resíduos hospitalares, incluindo a incineração de corpos de cães em forno improvisado.

A ONG buscou a condenação do canil e de sua proprietária por danos morais coletivos, ambientais e materiais, além da suspensão das atividades do canil e responsabilização dos entes públicos por falhas de fiscalização.

Em 1º grau, a juíza rejeitou os pedidos, sustentando que as irregularidades apontadas diziam respeito a fatos passados e que, à época da sentença, o canil operava regularmente, com alvarás e laudos favoráveis dos órgãos competentes.

Diante da decisão, o instituto recorreu ao TJ/SP pedindo a condenação com base na responsabilidade objetiva pelos danos causados, conforme os princípios da reparação integral e da função preventiva da tutela ambiental.

“Sofrimento indevido visando o lucro”

O relator, desembargado Marcelo Martins Berthe reconheceu que, embora o canil tenha sido posteriormente regularizado, os fatos comprovados nos autos demonstraram a prática reiterada de maus-tratos a mais de mil cães.

“No caso dos autos, restou incontroverso que os animais mantidos no Canil Céu Azul, à época dos fatos, foram submetidos a condições degradantes de existência, com superlotação, insalubridade, ausência de cuidados veterinários e desrespeito às normas básicas de bem-estar animal.”

Conforme explicou, o dano moral coletivo possui natureza autônoma e sancionatória por atingir valores difusos como o meio ambiente e o bem-estar animal, assim, prescinde de prova de prejuízo concreto. Portanto, a simples violação desses bens jurídicos já configura ofensa indenizável.

Nesse sentido, o desembargador destacou que”é indiscutível que o abalo à coletividade é evidente, já que restou comprovado […] que os apelados impuseram sofrimento indevido a centenas de animais visando o lucro, o que foi exaustivamente noticiado na mídia.”

Entretanto, o relator rejeitou os pedidos de indenização por danos ambientais e ressarcimento das despesas com os animais. Para o relator, não houve comprovação de degradação ambiental atual, e os cães foram doados ao Instituto de forma voluntária, com plena ciência das condições.

Responsabilidade objetiva e destinação da verba

A decisão também reafirma a responsabilidade civil ambiental é objetiva e solidária, nos termos do art. 14, §1º, da lei 6.938/81, com aplicação da teoria do risco integral:

“É irrelevante a aferição de dolo ou culpa, já que na hipótese deve ser aplicada a teoria do risco integral, que se justifica em função da natureza essencial dos bens protegidos e da necessidade de tutela eficaz e preventiva.”

O valor da indenização foi fixado em R$ 50 mil e será revertido ao FID – Fundo Estadual de Defesa dos Interesses Difusos, conforme previsão da lei estadual 6.536/89.

Os advogados do Instituto Caramelo, Igor Tamasauskas, Otávio Mazieiro e Beatriz Logarezzi, integrantes do escritório Bottini e Tamasauskas Advogados, ressaltaram que “a decisão representa um marco na jurisprudência ambiental e de proteção animal, reforçando que práticas abusivas contra seres sencientes não serão toleradas e devem ser reparadas não apenas na esfera penal, mas também moralmente perante a sociedade”.

Fonte: https://www.migalhas.com.br/quentes/430561/tj-sp-condena-canil-por-maus-tratos-a-mais-de-1-700-caes

Homem procurado por assaltar casa dos pais da namorada de Neymar é preso e solto horas depois

Invasão ocorreu em novembro de 2023. Assaltante foi preso no final do mês passado, mas liberado logo em seguida porque o mandado de prisão expedido pela Justiça não aparecia no sistema.

Um dos acusados de assaltar a casa dos pais da namorada de Neymar saiu pela porta da delegacia mesmo com prisão decretada.

Em novembro de 2023, quando três homens armados invadiram a casa de Edson e Telma Ribeiro, em um condomínio fechado em Cotia, na Grande São Paulo. Eles são os pais da influenciadora e empresária Bruna Biancardi, namorada de Neymar.

Ela não estava no local na hora do assalto. Naquela noite, o condomínio estava sem energia elétrica, por causa de um temporal. Os ladrões usaram cadarços para imobilizar os pais de Bruna e fugiram levando bolsas de grife, relógios e joias.

A polícia não demorou para esclarecer o crime. A câmera de segurança da portaria do condomínio, que funcionava por gerador, registrou os assaltantes chegando de carro. Um deles era vizinho dos pais de Biancardi. Eduardo Vasconcelos tinha 19 anos na época.

A imagem também mostra outros dois suspeitos dentro do carro: Pedro Henrique dos Santos Vasconcelos, então com 18 anos, e um homem identificado apenas pelo apelido de “Europa”.

Eduardo confessou sua participação no crime e continua preso até hoje, à espera do julgamento. Europa nunca foi identificado e Pedro está foragido. De acordo com uma oficial de justiça, em maio de 2024, quando foi entregar uma intimação na casa de Pedro, a mãe dele disse que o filho tinha morrido, sem que apresentasse provas disso. Mas, neste ano, foi comprovado que ele está vivo e só não foi preso ainda por causa de uma falha do sistema de justiça criminal.

No final do mês passado, policiais militares levaram Pedro para uma delegacia. Mas, depois de algumas horas, ele saiu tranquilamente pela porta da frente porque o mandado de prisão que a Justiça expediu contra Pedro, pelo assalto na casa dos pais de Bruna Biancardi, não aparecia no sistema.

“Todos esses mandados são colocados no sistema e só são retirados do sistema quando são cumpridos ou quando essa decisão é revogada ou anulada”, afirma Pierpaolo Bottini, advogado e professor de direito penal da USP.

Para entender como isso aconteceu, é preciso voltar ao último dia 19 de abril, na favela de Paraisópolis, zona sul de São Paulo. Naquela noite, os PMs que estavam em patrulhamento decidiram parar um carro suspeito.

O motorista fugiu e começou uma perseguição, que só terminou depois que o carro foi fechado por outro. De acordo com a polícia, o motorista disse que fugiu porque estava sendo ameaçado pelos dois passageiros. Ele foi liberado e os dois homens que estavam no banco de trás acabaram presos.

Na delegacia, um deles apresentou um RG falso, com o nome de Leonardo dos Santos Vasconcelos. Só que as digitais dele revelaram sua verdadeira identidade. Era Pedro Henrique dos Santos Vasconcelos — o homem procurado há quase um ano e meio pelo assalto na casa dos pais da namorada de Neymar.

Segundo os PMs, ao ser detido, Pedro tentou quebrar o celular que usava. Com ele, os policiais também encontraram uma touca ninja. A delegada de plantão autuou Pedro Henrique pelo uso de documento falso e o liberou, por ser um crime de menor potencial ofensivo.

O que dizem a defesa, o TJ-SP e a SSP

advogado de defesa de Eduardo, que está preso desde 2023 por causa do assalto, disse em nota que “tal falha processual coloca em xeque não só o processo em si, mas afeta toda a credibilidade do sistema de justiça do nosso país.”

Também em nota, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) afirma que o mandado de prisão contra Pedro “foi expedido durante a fase de inquérito sob sigilo” e que “por isso, ele não aparece em consulta pública.” Por telefone, a assessoria do tribunal informou que uma autoridade policial conseguiria consultar o mandado no sistema.

Já a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo (SSP) informou que, no dia em que Pedro foi preso, “foram realizadas as consultas em todos os sistemas e não foi localizada nenhuma ordem judicial de prisão.”

Quem seria o responsável?

O mandado de prisão temporária expedido contra Pedro pelo assalto na casa dos pais de Bruna Biancardi, que deixou de ser cumprido no dia em que ele foi levado para a delegacia, tem validade até 2033.

Mas quem fica responsável por incluir essa informação?

“Em regra, a própria autoridade que defere esse ato, ou seja, que determina essa prisão, já tem a possibilidade de acessar o sistema e fazer constar nesse sistema. Ou a própria autoridade, ou um assessor mandatado para isso, para que essa ordem conste no sistema”, acrescenta.

Enquanto se discute de quem foi a falha, Pedro segue foragido.

Fonte: https://g1.globo.com/fantastico/noticia/2025/05/11/homem-procurado-por-assaltar-casa-dos-pais-da-namorada-de-neymar-e-preso-e-solto-minutos-depois.ghtml

Damares é condenada a indenizar jornalista Vera Magalhães

Senadora terá de pagar R$ 1.000 por ter dito que jornalista zombou de um episódio de abuso sexual

A senadora Damares Alves (Republicanos-DF) foi condenada pela Justiça a pagar uma indenização de R$ 1.000 por danos morais à jornalista Vera Magalhães, apresentadora do Roda Viva, da TV Cultura.

Em 2022, a ex-ministra de Jair Bolsonaro acusou a jornalista de ter dado risada de estupro sofrido por ela quando criança. “A Vera é uma vergonha, é uma vergonha. Você sabe o que ela fez comigo? Ela riu do meu estupro de criança, aos seis anos de idade”, disse em entrevista à rádio BandNews.

A declaração foi referência a um comentário de 2018 da jornalista sobre um vídeo no qual a hoje senadora narrava que, quando criança, teria visto Jesus Cristo em um pé de goiaba. No dia seguinte, Damares esclareceu que o episódio tinha relação com abuso sexual.

A jornalista, então, fez uma retratação pública dizendo que não sabia que ela havia sido vítima desta violência.

Apesar disso, cerca de quatro anos depois, em 2022, Damares voltou ao assunto, afirmando que Vera “riu” e “zombou” do episódio.

A jornalista então entrou com processo contra a senadora. Ao condená-la, a juíza Fabiana Marini disse que Damares fez imputações falsas, extrapolando os limites da liberdade de expressão.

“A ré [Damares], ciente desta retratação, optou deliberadamente por omitir tal fato ao fazer suas declarações ofensivas anos depois, em 2022, sugerindo falsamente que Vera Magalhães teria zombado de um abuso sexual, em clara distorção da realidade”.

A senadora, que ainda pode recorrer, disse que não propagou notícia falsa e que os comentários de Vera foram “desproporcionais, jocosos e ofensivos”.

Em nota, os advogados Igor Sant’Anna Tamasauskas e Beatriz Canotilho Logarezzi, que representam a jornalista, afirmam que ” novamente, a verdade venceu”.

“Esta é mais uma condenação em que foi reconhecida a ilegalidade de condutas de apoiadores do ex-presidente Bolsonaro, que, no contexto eleitoral de 2022, tentaram descredibilizar Vera —sem sucesso. Felizmente, a Justiça vem reafirmando a liberdade de uma jornalista mulher no exercício livre de sua profissão, reprimindo disseminação de fake news e ofensas absolutamente infundadas”.

Fonte: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/painel/2025/05/damares-e-condenada-a-indenizar-jornalista-vera-magalhaes.shtml

back