Juizado Especial trouxe um novo jeito de fazer Justiça
Uma Justiça mais célere e mais acessível é o sonho de todos aqueles que trabalham e que utilizam o Poder Judiciário como instrumento de resolução de litígios. Nesse sentido, a figura dos Juizados Especiais merece especial atenção, como política publica essencial para o aprimoramento da prestação jurisdicional no país.
Desde sua origem, nos anos 80, os Juizados mostraram que é fundamental e viável trabalhar com um novo modelo de Justiça, orientado pelos princípios da eficiência, da oralidade, da informalidade e da busca de solução de conflitos pela conciliação. Seu surgimento não significou a mera criação de novos órgãos judiciais, mas a consagração de uma nova cultura, de um novo modelo, que prioriza uma atuação dos órgãos jurisdicionais voltada estritamente para sua finalidade última e essencial: a superação de controvérsias.
Assim, os Juizados trazem, em realidade, uma nova metodologia de fazer Justiça, um novo sistema processual, com suas próprias bases principiológicas, com seus próprios institutos dogmáticos, que marcam a superação da processualística clássica e tradicional e de uma estrutura ensimesmada, com notáveis dificuldades para exercer suas funções típicas.
As características dos Juizados Especiais demonstram sua vocação para a funcionalidade e para a solução racional de impasses. Seu regramento permite valorizar as decisões dos juizes de primeira instância, transformando-os em agentes de Estado propriamente ditos e não em meros despachantes de recursos para os tribunais. Para isso, contribuem instrumentos que inibem ou desestimulam práticas meramente protelatórias, como a imposição de custas, taxas, despesas e honorários para o acesso à turma recursal, inclusive aqueles que deixaram de ser pagos na primeira fase (Lei 9.099/95, artigo 54, parágrafo único). O resultado: apenas em 30% dos processos há recursos.
Por outro lado, a simplicidade que rege o processamento dos casos, que evita o apontamento de nulidades, e a cultura dos membros das turmas recursais, identificados com os princípios que regem o sistema dos Juizados, acaba por reduzir sobremaneira a reforma da sentença. Resultado: nas turmas recursais, a decisão original é mantida em 65,8% dos casos.
Com isso, os Juizados apresentam-se como um instrumento de realização da Justiça, que não suprime recursos, que garante o amplo acesso e a ampla defesa e, no entanto, resolve conflitos de forma eficiente e rápida. O êxito nesta experiência é passível de ser “exportado” para a Justiça comum, de contaminar a lógica vigente nos demais ramos e instâncias judiciais. No entanto, o contrário também pode ocorrer, e as vicissitudes da Justiça comum podem afetar os Juizados, minando os avanços alcançados com esta inovadora forma de efetivação de Justiça.
O fortalecimento do modelo dos Juizados Especiais faz-se necessário. Tal tarefa não é simples e exige, em primeiro lugar, uma correta avaliação sobre seu funcionamento, sobre os acertos e erros na condução destes órgãos, para que se tenha uma melhor compreensão de seus pontos fortes e fracos e, diante disso, construir uma estratégia para sua consolidação.
Com esta finalidade, a Secretaria de Reforma do Judiciário e o Centro Brasileiro de Estudos e Pesquisas Judiciais, com o apoio da Telemar e o auxilio do Fórum Nacional dos Juizados Especiais e do Conselho Nacional de Justiça, elaboraram o Diagnóstico dos Juizados Especiais. O texto que segue tem o escopo de fazer algumas breves considerações sobre alguns números apresentados neste diagnóstico, que permitam alguma reflexão inicial sobre os rumos para a expansão deste modo ideal de Justiça.
A análise dos dados obtidos pela pesquisa demonstra que, em diversos aspectos, há indícios da ocorrência nos Juizados dos mesmos problemas que de há muito afetam a Justiça comum e que podem inviabilizar seu funcionamento. Estes problemas, que preferimos nominar de pontos sensíveis, são o excesso de litigiosidade, a dificuldade de realização de conciliações, bem como os obstáculos para o cumprimento dos acordos e das decisões judiciais, e a falta de estrutura e de gestão. Analisemos cada um deles rapidamente.
Em primeiro lugar, os Juizados Especiais demonstram sinais de estafa em relação ao numero de processos e de demandas que se apresentam. O numero de questões levadas a estes órgãos da Justiça é exagerado (cerca de 153.364 ao ano por estado em média — apenas no estado de São Paulo foram contabilizados 983.601 casos em 2004) e as causas desta excessiva litigiosidade devem ser objeto de atenção.
Uma análise inicial apontaria o paulatino aumento de competência atribuída a estes órgãos o motivo do crescimento do volume de demandas a eles direcionada. Desde sua idealização, os Juizados, que inicialmente julgavam apenas casos simples, de valor de até 20 salários mínimos, passaram a apreciar questões até 40 salários mínimos. Ademais, foi acrescida no rol de suas atribuições a execução de seus próprios julgados, a execução de títulos extrajudiciais, a ação de despejo em causa própria e a admissão de microempresas como reclamantes, dentre outras, que, em tese teriam saturado estes órgãos.