Skip to main content

As PPPs e a solução de uma dívida ambiental

O Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE) aprovou, no dia 1º de julho, a modelagem jurídico-econômica da Prefeitura de São Carlos para a contratação de uma parceria público-privada (PPP) para a execução do serviço de coleta, tratamento e destinação final de resíduos sólidos urbanos, com a implementação de aterro sanitário. É bem verdade que o tribunal já se manifestara a respeito da possibilidade desse tipo de contrato quando da análise do modelo apresentado pela municipalidade de Osasco. O que pode ser considerado um avanço no posicionamento do TCE é a indicação de um modelo de avaliação da conformidade dos estudos econômicos e jurídicos com as previsões da lei federal que instituiu as PPPs no país.

Com efeito, reforçando o papel institucional dos tribunais de contas na garantia da boa aplicação dos recursos públicos, a decisão da corte paulista para o caso de São Carlos reafirma a possibilidade de parcerias entre o setor privado e a administração pública para a correta solução da questão dos aterros sanitários no Estado de São Paulo. Uma reportagem do jornal “Folha de S.Paulo” publicada em 30 de janeiro deste ano informava que nada menos do que 78 lixões ainda persistiam em todo o Estado, sendo que a secretaria de meio ambiente fixou o prazo de até dezembro de 2009 para extingui-los. O enfrentamento desse problema socioambiental demanda vultosos investimentos, muitas vezes incompatíveis com as finanças dos municípios.

Usualmente, as prefeituras se encarregam de construir os aterros sanitários, quando dispõem de meios suficientes, e prestam o serviço de coleta de resíduos diretamente ou mediante contratos regidos pela Lei de Licitações, cujo prazo de vigência é restrito a cinco anos e acaba limitando a possibilidade de financiamento do particular na sua execução.

A partir do caso do município de Osasco, e particularmente de São Carlos, o TCE não somente avançou na chancela ao novo modelo – instituído no país em 2004 com a Lei das PPPs e reforçado pela Lei do Saneamento Básico em 2006 – como também indicou às administrações um modelo de avaliação dos estudos econômicos para a conformidade de um empreendimento. Segundo o TCE, a opção administrativa pela PPP deve ser devidamente justificada a partir de estudos socioeconômicos em que fique cabalmente demonstrada a sustentabilidade financeira do empreendimento, ao mesmo tempo em que seja assegurada a economicidade aos cofres públicos. No caso da cidade de São Carlos, restou demonstrado que a implantação de um aterro sanitário novo exigiria investimentos da ordem de R$ 20 milhões, suplantando a capacidade anual de investimento das finanças públicas municipais em quase duas vezes. E ainda, a validação do modelo passou pela avaliação do valor presente líquido dos investimentos exigidos para o atendimento do serviço, segundo as possíveis modelagens jurídicas. Ou seja, comparou-se o valor presente líquido do serviço, caso prestado diretamente pela prefeitura ou segundo a Lei de Licitações, com o valor presente líquido segundo o fluxo de pagamentos previsto na modelagem da PPP. Como houve vantagem, validou-se a parceria público-privada.

Segundo o entendimento fixado pelo tribunal de contas, o alongamento dos prazos de vigência – uma PPP pode se estender por 35 anos -, aliado a regras contratuais estáveis e garantias ao parceiro privado, assegura a economicidade aos cofres públicos na oferta desse indispensável serviço ao cidadão. Outro ponto que pode ser destacado na novel modelagem consiste no desatrelamento entre as quantidades de resíduos depositadas no aterro sanitário com os valores percebidos pelo parceiro privado. Segundo o sistema de metas contratuais previstos no termo de referência de São Carlos, o parceiro privado será remunerado pela estrutura necessária à prestação do serviço, dissociando o incremento remuneratório de quantidades de lixo produzido na cidade. Privilegia-se, pois, o meio ambiente e as futuras gerações, pois o parceiro privado será estimulado a buscar meios de diminuição de quantidades de resíduos, seja mediante campanhas de conscientização, seja mediante a adoção de novas tecnologias de tratamento de resíduos.

É importante realçar que o Tribunal de Contas do Estado permitiu que a administração contribuísse com a efetividade da avaliação da metodologia proposta, garantindo a apresentação de elementos econômicos, jurídicos, sociais e ambientais para o enriquecimento da análise recém-concluída e que decerto será considerada nos novos modelos a serem apresentados pelas administrações municipais paulistas.
Esse posicionamento reafirma o tribunal de contas paulista como uma efetiva parceira das administrações, na busca pelas soluções mais adequadas para o atendimento do interesse público. Com isso, ganham todos: a administração, que terá ao seu alcance um moderno instrumento contratual para a sua organização; os cidadãos, cuja demanda por serviços públicos poderá ser atendida de maneira segura e racional; e o setor privado, que poderá contribuir com sua expertise segundo uma indispensável segurança jurídica.

Sebastião Botto de Barros Tojal e Igor Tamasauskas são advogados e sócios dos escritórios Tojal, Teixeira Ferreira, Serrano e Renault Advogados e Bottini e Tamasauskas Advogados, respectivamente
Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações.

back