Para advogados ouvidos pela equipe da coluna, a tese da defesa do ex-presidente não se sustenta.
“Eu trabalho na área criminal há 24 anos e esse me parece um argumento até pueril. Alegar embriaguez ou uso de drogas não é suficiente para afastar a responsabilidade criminal”, diz Helena Lobo Costa, que além de criminalista é professora de Direito Penal na Universidade de São Paulo.
“Se você tem uma confusão mental em decorrência de alguma substância ou remédio que tomou eventualmente, sem conhecimento de seus efeitos, pode-se até recorrer a esse argumento. Mas quando se está tomando uma substância que sabidamente altera o estado mental ou capacidade de autocontrole, não pode alegar inimputabilidade”, explica o criminalista Pierpaolo Bottini.
Na entrevista que deu após a oitiva, ex-ministro da Secretaria de Comunicação e atual assessor de imprensa de Bolsonaro, Fabio Wajngarten, afirmou que ele “nem sequer havia percebido que havia postado o referido conteúdo”. Segundo o ex-ministro, “assim que alertado”, Bolsonaro apagou o conteúdo.
As declarações sugerem que a estratégia jurídica de Bolsonaro será tentar recorrer ao uso da droga não para afastar a inimputabilidade, e sim o dolo — quando fica provado que a pessoa teve a intenção de cometer um crime.
“O que parece é que eles sabem que não podem alegar que o ex-presidente perdeu o autocontrole por causa da morfina, ou que não sabia do que se tratava quando postou aquele conteúdo”, avalia Bottini. “O argumento deve ser o que de Bolsonaro se equivocou e postou no lugar errado, ou seja, sem a intenção de disseminar o conteúdo golpista.”
Ainda assim, trata-se de uma tese frágil, na opinião de Helena Lobo Costa.
“É verdade que o equívoco afasta a responsabilidade em várias situações. Apagar o post poderia indicar que houve equívoco, mas não estamos falando de um fato corriqueiro. O que houve em 8 de janeiro foi um ataque aos poderes, uma depredação generalizada, e o autor do post é ex-presidente da República. Se fosse mesmo um equívoco, uma postagem com a qual ele não concordasse, teria que ter gerado uma retratação ou um outro post se manifestando contra os ataques de forma contundente.”
Fonte: https://oglobo.globo.com/blogs/malu-gaspar/post/2023/04/uso-de-morfina-nao-tira-responsabilidade-de-bolsonaro-em-post-com-ataques-a-sistema-eleitoral-dizem-juristas.ghtml