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Uma nova Justiça

PIERPAOLO BOTTINI

Não é de hoje que se critica a morosidade do Poder Judiciário. Há muito tempo o cidadão brasileiro se inflama contra a lentidão na tramitação dos processos. A dificuldade de ver solucionado um litígio por meio de uma ação judicial é patente, os obstáculos para obter uma decisão judicial e para cumpri-la são facilmente perceptíveis e as possibilidades de protelar e de postergar um processo por muitos anos fazem com que a Justiça seja desacreditada e desprestigiada como mecanismo formal de resolução de conflitos.

A solução para esse estado de coisas não é mágica -nem simples. Enfrentar o problema da demora das decisões judiciais exige prudência e responsabilidade para afastar propostas levianas ou corporativas e para encontrar, realmente, os gargalos e os nós do processo -e superá-los de maneira eficiente.

Por isso, devem ser afastadas de plano as sugestões de supressão de recursos, de instrumentos de defesa e de etapas processuais relevantes, porque, se assim fosse, seriam afetados os direitos constitucionais de um processo justo e equilibrado, no qual as partes podem se manifestar e argumentar suas teses para convencer o juiz.

Nessa linha, o Ministério da Justiça, por meio da Secretaria da Reforma do Judiciário, em conjunto com o Supremo Tribunal Federal, com o Instituto Brasileiro de Direito Processual e com entidades de magistrados, promotores, advogados e defensores, apresentou 26 projetos de lei com o intuito de reformar o processo civil, penal e trabalhista.

Tais projetos foram subscritos pelo presidente da República, pelo presidente do STF, pelo presidente da Câmara dos Deputados e pelo presidente do Senado e apresentados ao Congresso Nacional como parte de um pacto por um Judiciário mais rápido e republicano.

Das propostas apresentadas, cinco já foram aprovadas e sancionadas após intensa discussão e debate com os setores envolvidos. Todas eles alteram aspectos importantes do processo civil brasileiro e são fruto de uma construção conjunta e madura, da qual participaram os personagens que conhecem as mazelas do sistema judicial, que são acostumados a lidar, dia-a-dia, com a dificuldade que certos ritos e atos impõem.

Essas novas leis não surgem de discussões etéreas e acadêmicas sobre teorias jurídicas vazias, mas de constatações de problemas reais, concretos, que impedem o funcionamento da Justiça.

Sabe-se que os processos não andam por uma série de motivos, como a dificuldade para encontrar o devedor ou para encontrar os bens do devedor. Também são paralisados pelo excesso de recursos meramente protelatórios, ou seja, recursos que têm como única finalidade postergar o cumprimento das decisões judiciais. Não é necessário ser advogado, juiz ou promotor para saber desses problemas. Basta ser usuário dos serviços da Justiça.

É com essa visão e para enfrentar esses problemas comuns e usuais que surgiram as cinco primeiras leis que alteram o processo civil brasileiro. Em seu conjunto, regulamentam a tramitação dos processos de maneira precisa e racional, sem suprimir garantias constitucionais e, no entanto, conferindo uma racionalidade efetiva aos procedimentos judiciários. Modificam a forma de execução da sentença, a forma de apresentar os recursos e os procedimentos de julgamento pelos tribunais.

Tome-se como exemplo a criação da súmula impeditiva de recursos. Essa lei impede uma parte no processo de recorrer se a sentença do juiz estiver de acordo com uma súmula (orientação de julgamento) do STF ou do Superior Tribunal de Justiça. Nesses casos, o juiz, diante de um caso concreto, tem a liberdade de decidir da mesma forma que o tribunal ou, se não estiver de acordo com aquela orientação, posicionar-se contrariamente à sumula, ou seja, mantém a autonomia e a independência em relação aos órgãos superiores. No entanto, caso esse magistrado decida de acordo com a orientação da súmula, não faz sentido que a parte perdedora prossiga com uma demanda que, evidentemente, não terá sucesso nas instâncias superiores.

Inúmeras outras alterações foram aprovadas, todas elas no mesmo sentido de construir um novo processo civil, mais ágil e mais eficiente.

Evidentemente, não basta a alteração legal para transformar a Justiça. Certamente, uma modificação na cultura dos operadores do direito é importante para a substituição do atual estado de excessiva litigiosidade. Mas, sem duvida, a aprovação das leis mencionadas é um marco importante que permitirá a consolidação de um processo voltado para sua finalidade última e única, que é a solução definitiva de conflitos e a execução das decisões judiciais de maneira segura, rápida e justa.

Pierpaolo Cruz Bottini, 29, advogado, mestre e doutorando em direito penal pela USP, é o secretário da Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça. É co-organizador do livro “Reforma do Judiciário”.

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