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Políticas de prevenção e combate à lavagem de dinheiro e factoring: reflexões sobre a nova regulamentação do COAF e o papel do profissional de compliance

Em razão do recente julgamento da Ação Penal nº. 470 do STF, reconhecida por todos pelo apelido “mensalão”, das modificações realizadas na Lei de Lavagem de Dinheiro por meio da Lei nº. 12.683/2012, bem como da recente entrada em vigor da Resolução nº. 21 do COAF, o papel do profissional de compliance e sua corresponsabilidade no crime de reciclagem de capitais ganharam destaque no cenário nacional.

O reconhecimento do Poder Público de sua incapacidade para prevenir e investigar os crimes de lavagem de dinheiro consiste na principal razão da implementação da cooperação privada para aquelas instituições que atuam em setores sensíveis, assim considerados aqueles mais comumente utilizados para as operações de mascaramento de capital de origem ilícita. Dentre as instituições elencadas, estão as empresas de fomento comercial (factoring), nos termos do artigo 9º, inciso V, da Lei nº. 9.613/1998.

Desse modo, o setor privado é caracterizado como gatekeeper, tendo em vista sua posição privilegiada. E é justamente em razão de tal arranjo que são impostas às pessoas obrigadas os seguintes deveres administrativos: (i) de registro (know your client), (ii) de comunicação das transações suspeitas; e (iii) de desenvolvimento de políticas internas de compliance .

De acordo com Lei nº. 9.613/1998, quando determinado setor não possuir órgão fiscalizador ou regulador próprio, como é o caso das empresas de fomento comercial, competirá ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF) a atribuição de regulamentação.

Assim, foi editada a Resolução nº. 21 do COAF, de 20 de dezembro de 2012, que acaba de entrar em vigor e detalha as obrigações ao setor de fomento comercial, dispondo sobre política de prevenção à lavagem de dinheiro (compliance), classificação de risco dos clientes e das operações, cadastro de clientes e demais envolvidos (know your client), registro das operações, comunicações ao COAF e outras disposições.

Muito embora a regulamentação de tais obrigações seja fundamental, uma vez que prevê a forma de cumprimento das obrigações estabelecidas em lei – o que reflete diretamente na preservação da empresa e de seus dirigentes, eximindo-os de qualquer responsabilidade por eventuais atos ilícitos praticados sem o seu conhecimento -, algumas críticas parecem importantes.

Em primeiro lugar, em relação à aprovação da política de compliance, a qual deve ser formalizada, exige-se que seja realizada “pelo detentor de autoridade máxima de gestão” (art. 2º, parágrafo único). Ora, ainda que não exista óbice à concordância com a política de compliance pela principal autoridade da instituição [a aprovação é sim conveniente], mais adequada e importante seria a previsão de um setor independente para criação, treinamento e monitoramento das atividades desenvolvidas pelos empregados.

Outro problema é a previsão, art. 7º, inciso II, parágrafo 1º, de que na categoria de risco intermediária (se houver), deve-se incluir no cadastro informações ou documentos proporcionais ao respectivo risco. A redação é extremamente genérica e pouco auxilia as instituições. Quais seriam as informações ou documentos proporcionais ao respectivo risco? A falta de clareza é preocupante.

Por fim, no que diz respeito às comunicações ao COAF, vale mencionar a indicação – dentre as operações suspeitas – daquelas “cuja origem ou fundamentação econômica ou legal não sejam claramente aferíveis” (art. 12, inciso II). Parece difícil determinar quando uma operação se enquadrará em tal hipótese. É verdade que existem situações em que a origem ou fundamentação é claramente suspeita, mas há casos em que tal é difícil, especialmente se levarmos em conta que os crimes fiscais agora são antecedentes de lavagem de dinheiro. Como se certificar com clareza que a operação não tem origem em um tipo penal da Lei nº. 8.137/1990?

Aqui valerá a regra da comunicação regular ao COAF, gerando uma infinidade de notificações desnecessárias à autoridade fiscalizadora.

Entende-se que o COAF busca uma operação de filtragem constante de informações do profissional do setor sensível. No entanto, alguns parâmetros mais objetivos confeririam mais segurança às atividades. Parece que a autoridade pública é a fonte regulamentar, que deve indicar os elementos de uma operação suspeita com mais clareza, e não o profissional do setor sensível. E existem mecanismos para que ela possa criar novas normas diante de situações urgentes. Basta apontar a autorização ao presidente do COAF, em ato isolado e independente de aprovação do colegiado, a listar operações cuja comunicação passa a ser obrigatória (art. 13, inciso IV) .

Daí a importância do aprimoramento da regulamentação.

De qualquer forma, o profissional deve buscar a forma mais adequada e eficaz de cumprir com as regras e resoluções. Por isso, a criação ou estruturação de um setor de compliance é relevante para garantir que a instituição tome todos os cuidados necessários para evitar o envolvimento de sua estrutura com o crime organizado, bem como impedir a responsabilidade penal, civil e administrativa dos seus dirigentes diante de eventual descumprimento, por terceiros, de normas e atos normativos sobre o tema.

 

[1] BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy; BOTTINI, Pierpaolo Cruz. Lavagem de dinheiro: aspectos penais e processuais penais: comentários à lei 9.613/1998 com as alterações da Lei 12.683/2012, p. 37.

[1] BOTTINI, Pierpaolo Cruz; ESTELLITA, Heloisa. Resoluções sobre lavagem de dinheiro merecem atenção. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2013-abr-09/direito-defesa-resolucoes-coaf-lavagem-dinheiro-merecem-cuidado, acesso em 03.05.2013.

Fonte:ANFAC, terça-feira, 04 de junho de 2013. Disponivel em: http://www.anfac.com.br/v3/informativos-noticias.jsp?id=1025.

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